segunda-feira, novembro 30, 2009

Twilighting

Não sei porquê. Para mim é um mistério. A verdade é que me vejo a suspirar, ainda que em segredo e em silêncio, pelas personagens do filme de adolescentes Twilight.
Caramba, acontecer-me isto logo a mim. Logo a mim!



quarta-feira, novembro 25, 2009

Armada em boa, podia ter arranjado um 31

Cheguei tarde. Havia pessoas espalhadas pelo espaço nocturno, pouco iluminado, da moda (Lilipop?! Lolipop?!). Eram poucas e eu pouco as conhecia.Ou reconhecia?
A música tocava como toca nas discotecas: muito alta. As vozes tentavam sobrepor-se à música. Umas conseguiam, outras nem por isso. De qualquer forma, eu sorria sempre. Um sorriso diz tanto com tão pouco.
Na parede, projecção de frases emblemáticas: a enquadrar um momento de celebração. As t-shirts surtiam mais efeito do que as projecções, só não sei se mais do que a estátua.
Os cumprimentos ora se faziam com um estender de mão ou com um manear de cabeça a indicar um beijo, um único beijo na face. Comigo é que não, sem modas, arrisco sempre dois, não conseguindo evitar a atrapalhação do manear de cabeças: ai, que eu queria só dar um, mas ela espera o segundo!
Não dancei. Conversei pouco. Mas vi o que soube ser o futuro: no meio daquelas poucas pessoas em celebração, vi uma mulher magérrima, vestida de preto, com um copo de bebida na mão - nada de esquisito até aqui, a não ser as suas feições. Foi só quando ela se virou que topei o código de barras que ela tinha inscrito na pele das costas. No futuro, pensei, todos teremos esse código de barras, que permitirá identificar-nos em qualquer lugar ou em qualquer tempo.
Em ansiedade, mas sem poema, fixei aquela mulher que vi como se estivesse numa plataforma de ficção científica.
Armada em boa, ri-me dela, por ignorância. E só não arranjei nenhum 31 porque, apesar de esfomeado, o meu companheiro de viagem riu comigo, atenuando a ignorância por partilha.

terça-feira, novembro 24, 2009

Preciso...

"Preciso de uma amiga."
Só assim, uma frase simples a entrar em surdina no telemóvel que te desperta.
"Preciso" não bastaria nada mais para perceber que o pedido era sério, havia a constatação de uma necessidade.
"De uma amiga", mais sério o pedido se tornara. Não era de dinheiro. Não era de comida. Mas de amizade.
Quantas vezes escrevi uma sms semelhante sem nunca a ter escrito? Quantas vezes não já não quis dizer "preciso"?
Na verdade, para dizer "preciso" é obrigatório dotar-nos de coragem. Ele teve coragem nesta manhã de Novembro, exactamente no momento em que a coragem lhe fugira.
A mensagem recebeu uma resposta imediata e não me lembro exctamente das palavras que usei, mas seria com certeza qualquer coisa como: "Estou aqui."

Carta Aberta a Herberto Hélder

Não me conheces, Herberto. Mas eu conheço-te a ti. Andámos tantas vezes de mãos dadas pelos terrenos enlameados da Faculdade de Letras de Lisboa. Eu era, então, uma jovem tão jovem que de jovem que era só sonhava sonhos jovens. Tu, para mim, também és jovem. Não te sinto com 79 anos quando acaricio a tua pele impressa nos livros que escreveste. Gosto tanto dos livros que escreveste.
Sabes uma coisa? Este lugar, este lugar de onde te escrevo estas palavras só existe porque tu existes. Os Passos em Volta deram-me a volta. Desde que os li não me senti mais a mesma. Serás tu o mesmo depois de cada poema escrito?
Tenho saudades tuas, Herberto. Tenho saudades de nós e da Faculdade de Letras de Lisboa. Lembras-te do cheiro da terra molhada a entranhar-se nos meus sapatos jovens? E do meu riso a antecipar uma vida cheia de livros?
Era natural chegar  atrasada às aulas (quem me conhece, que não tu, sabe que me atraso de forma compulsiva), mas trazia-te pela mão, pois consolavas-me no meu desconsolo.
Gosto de ti, Herberto. Gosto de ti e do teu peixe vermelho, que foi verde e que ficou amarelo. Gosto tanto de ti.
Gosto do abalo que a tua poesia me provoca. Como se de um Poema Contínuo se tratasse.
Não me conheces, Herberto. Nunca me conhecerás. Só eu te conheço a ti e aos teu livros que leio de colher na boca, sem colher ou sem boca.
Se eu pudesse abraçava-te e pedia-te baixinho: escreve a minha vida em poema surdo e leva-me de volta para o tempo em que eu era jovem e de tão jovem que era tinha apenas sonhos jovens. Detesto sonhos gastos.

terça-feira, novembro 17, 2009

Hora Kit-Kat

Na maior parte das empresas há a costumeira hora kit kat, adoptada do popular anúncio ao chocolate com o mesmo nome; na minha, há a chamada hora Shining.
Invariavelmente, todos os dias, um carrinho é arrastado por estes longos corredores. Faz um barulho ensurdecedor, tipo vrum... vrum... iiiiiiii... vrummmmm... iiiiiiii... VRUMMMMMM...
Pior, é que ninguém sabe de onde vem nem para onde vai. Nem ninguém sabe, sequer, se o maldito carrinho é empurrado por alguém ou se se empurra a si próprio. Faz-me imediatamente recordar as cenas mais impressionantes do filme que celebrizou o Jack Nicholson, The Shining.

"É QUE NÓS SOMOS UM POEMA"

"É que nós somos um poema"

Era assim que explicava Heitor Villa-Lobos, o mais famoso compositor brasileiro, falecido há 50 anos (17 de Novembro de 1959), o facto da sua música ter um pendor tão sedutor.
Habituados a considerar os brasileiros um povo alegre e descontraído - Agostinho da Silva referia-se-lhes como sendo "portugueses à solta" - a música de Villa-Lobos traz-nos o lado mais  melancólico, triste e, até, saudosista da maneira de ser brasileira.
Ouso em afirmar que o mais agradável da sua música poderá estar na constatação, sempre feliz, que as pessoas e, na sua extensão, os povos, não têm uma, e apenas uma, forma de ser. Aliás, não deixa de ser simplista fazer afirmações tão genéricas quanto os alemães são metódicos, os portugueses caóticos e os brasileiros efusiantes. O interessante é poder ser tudo isso e o seu contrário. Que é o que acaba por ser a música de Villa-Lobos.
Se nunca ouviram, oiçam-na. Há cerca de 1200 composições à escolha.

segunda-feira, novembro 16, 2009

Detalhes

Com os olhos a arder em febre, eles e o seu corpo frágil e magro - a Escarlatina e a Gripe A, comedoras sanguinárias de saúde e vivacidade,  roubaram-lhe simultaneamente as curvaturas de chicha que eram já poucas, mas estavam lá -, abraçou-me em despedida, quando me disse:
- Estás tão bonita com isso vestido - ao mesmo tempo que me acariciava com as suas maõzinhas de criança a camisola branca que trazia.
Estou certa que a beleza que viu em mim era já o resultado do delírio febril, mas aquelas palavras aqueceram-me o coração o resto do dia.

quinta-feira, novembro 12, 2009

Um percebe, percebes?

Amigos trintões em discussão do antigamente:

Um deles - Oh pá! Eu era tão verdinho que mais parecia um percebe. A coisa só lá ia se me chupassem.
Os outros dois, primeiro incrédulos, depois em agonia de riso absoluto, nada conseguiram fazer, além de rir que nem uns perdidos, chamando a atenção de todos os que procuravam ter um jantar tranquilo e sereno, após outro dia de trabalho.

quarta-feira, novembro 11, 2009

Desapontamento

(ao telefone)

Eu - Sim? Olá, bom-dia!
Alguém (que eu ainda não sabia quem) - Bom-dia. Como está? Fala a directora de turma do Rodrigo.
(nervos, aflição, suores frios - muito bem disfarçados, diga-se)
Eu - Ai sim? Já sei, quer dar-me os parabéns pela maravilhosa criatura que é o meu filho. Não?! Hunft... Bem me parecia!

terça-feira, novembro 10, 2009

"estou feliz de morrer"

Não me venham falar em felicidade, em árvores plantadas no oceano; não me venham falar em amor, em sorrisos de ternura quando se pensa em alguém; não me venham falar de cumplicidade, de sexo, de plenitude.
Falem-me antes do caos que é a vida; do desmantelamento que o nosso coração sofre de cada vez que julga amar e ser amado; da desagregação e segregação de detalhes e de memórias que nos roubam a vontade e  nos impossibilitam sermos mais com menos.
Falem-me do acordar doloroso de cada dia, dos detalhes espalhados pela casa: dos iogurtes com pedaços no frigorífico, dos calções e da t-shirt guardados na gaveta.
Falem-me da espera que se faz, mesmo que não se deseje, pela voz, por aquela voz em voraz ansiedade; falem-me das gargalhadas adiadas um dia, outro dia.
Não me venham falar que tudo passa. Porque tudo é demasiado para limitar-se a passar. Passará como passam os carros nas estradas, como passam as pessoas nas estações de comboio ou de metro?
 De que marcas eram os carros? De que cores se vestiam as pessoas?
É que eu sei de cor a cor dos calções e da t-shirt guardados na minha gaveta. E sei a marca dos iogurtes com pedaços que apodrecem no meu frigorífico.


Ninguém me venha dar vida,




que estou morrendo de amor,



que estou feliz de morrer,



que não tenho mal nem dor,



que estou de sonho ferida,



que não me quero curar,



que estou deixando de ser



e não me quero encontrar,



que estou dentro de um navio



que sei que vai naufragar,



já não falo e ainda sorrio,



porque está perto de mim



o dono verde do mar



que busquei desde o começo,



e estava apenas no fim.







Corações, por que chorais?



Preparai meu arremesso



para as algas e os corais.







Fim ditoso, hora feliz:



guardai meu amor sem preço,



que só quis a quem não quis.



Cecília Meireles, in 'Poemas (1947)'

segunda-feira, novembro 09, 2009

Vida doméstica e domesticada

- Mãeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee. Onde estão as minhas calças?
- Que calças?
- Aquelas. As que  estiveram estendidas há duas semanas.
Calmamente, dirijo-me ao quarto dele.
- Precisas dessas calças em particular quando só aqui eu conto: uma, duas, três, quatro pares de calças?!
- Sim, mãe. Nenhuma dessas fica bem com as minhas botas. Eu quero aquelas.
- São sete da manhã, tens várias calças disponíveis mas queres aquelas que eu nem sei quais são! - já levemente irritada.
- Mas mãe, deixa-me explicar...
- Não, não há tempo para explicações, não podes atrasar-te, logo, começa a vestir-te.
- Mãe, encontra-me lá as calças. As outras não ficam bem.
- Possa, que chatice. Com tanta calça no quarto e ainda me chateias com umas que eu não vi, nem sequer sei quais são! - Muito irritada, já sem o levemente, começo a mexer na roupa que se encontra para passar.
-São essas, mãe, são essas. Podes passá-las?
- Aviso-te que é a última vez que te passo propositadamente um par de calças por capricho, ouviste bem? - apetecia-me ter-lhe gritado "ouvistes bem?", o "ouvistes" aqui tinha muito mais força.
Passei as calças dele a ferro e umas pretas, minhas. É que de todos os pares que eu tinha no amário, apetecia-me A-QUE-LAS.

Antes do Amanhecer ou Antes do Anoitecer?

Foi há muito tempo que um amigo me aconselhou ver o filme. Lembro-me de, na altura, tê-lo procurado e alugado no videoclube perto de casa, embora o filme, parece-me, não estivesse preparado para ser visto por mim.
Hoje dei com ele num canal de televisão e eis que personagens e intriga se deleitaram nas minhas mãos e, num ápice, se renderam ao culto da minha pessoa. Como tudo o que vi fez um eco tão profundo nos meus sentimentos e emoções, levantei-me do sofá e fui  procurar ver a sequela, que sabia existir.
Houve um processo de identificação tal com a personagem feminina que determinadas falas podiam muito bem ser minhas, além de ela ser também do signo Sagitário e ter 33 anos:
"Ultimamente os casais andam tão confusos... Deve ser porque os homens precisam sentir-se essenciais e já não se sentem. Há muito que têm na cabeça a necessidade de ser o sustento da casa. Eu sou uma mulher forte e independente na minha vida profissional. Não preciso de um homem que me sustente, mas continuo a precisar de um homem que me ame e que eu possa amar."
Os filmes?
Before Sunrise e Before Sunset.

vem passear com o meu telefone, querida

um casal passa por mim. primeiro para cima. minutos mais tarde, para baixo. ele, de telefone em punho, viceferava contra alguém que eu não via, mas adivinhava. ela seguia um pouco atrás, muda. atirada contra a multidão que passava, em correpio de fim de tarde. ele embrenhado no telefone e naquela presença que era trazida apenas pela linha telefónica. caminhavam os dois como se caminhassem lado a lado, embora não caminhassem lado a lado. ela não fazia parte da conversa, nem da existência, que acontecia entre o ser que era apenas voz e o marido? namorado?.
ainda que não seja estranho encontrar pessoas que falam ao telefone, ignorando aquelas com quem se encontram fisicamente; aquele casal causou-me uma impressão forte e precisa: deixando-me a pensar...

sexta-feira, novembro 06, 2009

Eu/ o silêncio/ a vida

A escrita não me tem acontecido e eu habituei-me a respeitar este silêncio que as palavras não ditas me trazem. Sento-me ao colo delas, num embalo de ternura, e aguardo que a vida passe, que o tempo chegue e que o silêncio grite tudo o que eu não posso mais ouvir: tenho tanta vontade de voltar à escrita, voltando a mim...

domingo, novembro 01, 2009

As coisas apagadas não voltam mais

Há coisas que só apagadas se resolvem. Há que saber usar a borracha de vez em quando. Sem medo. Sem culpa. Sem nada. Apagar para esquecer.