quinta-feira, abril 28, 2011

Dá-me música

Gosto de regar a minha actividade profissional com boa música. Ultimamente selecciono-a do programa da TSF, A Playlist de..., uma vez que o meu computador não lê CD. O Windows Mediaplayer avariou-se... para mal dos meus pecados.
Já na altura em que fazia revisão de texto, lembro-me que procurava o silêncio - indispensável para a concentração e a focalização no erro e na agramaticalidade do discurso escrito - no grito melodioso da música.
A Playlist de... é um programa em que distintas personalidades seleccionam músicas que depois partilham com a audiência .
O que o programa tem de interessante é o facto de, por um lado, dar a conhecer  os gostos musicais das pessoas convidadas e, por outro, permitir que o ouvinte se distancie ou se aproxime daqueles.
Por exemplo, assim que ouvi a selecção musical do José Luís Peixoto tive a certeza absoluta de que não há qualquer coincidência na nossa emotividade musical. E eu pensava que sim, até porque sempre gostei muito da maior parte das coisas que ele escreve (como se uma coisa estivesse relacionada com a outra) - a excepção vai para algumas crónicas e para o último romance que nem consegui terminar: Livro.
No lado oposto está, por exemplo, o Rodrigo Leão. Estava capaz de ouvir, em repeat, a sua selecção musical, vezes e vezes sem conta.
A dar razão ao Rui Veloso, Rodrigo, pode pedir-me em casamento que será, com toda a certeza, uma união feliz!

Nota: Aos curiosos, experimentem clicar no título e acederão à playlist do Rodrigo Leão. Boa viagem!

sábado, abril 23, 2011

A família está bem?

Família. Já não é o que era. E ainda bem?!?

Vi The Kids Are All Right, um filme de Lisa Cholodenko, com as belíssimas Julianne Moore e Annette Bening.
Aquilo que mais apreciei no filme foi aquilo que também mais apreciei no Brokeback Mountain, de Ang Lee - a seriedade, a integridade e o respeito com que é abordada a temática homossexual.
Lisa e Ang provam que falar do amor entre pessoas do mesmo sexo pode  - e deve - processar-se em moldes semelhantes de quando se procura falar do amor entre pessoas de sexo diferente.
Julianne e Annette são casadas há mais de 20 anos e vêem-se a braços com aquilo que um casamento longo normalmente proporciona: invisibilidade.
A chegada de um elemento exterior - Mark Ruffalo - obrigará a que a família (composta por dois filhos adolescentes - Mia Wasikowska e Josh Hutcherson) rasguem o manto da invisibilidade e, por assim dizer, o da inocência.
Os dramas retratados neste filme não são diferentes dos dramas pelos quais passam famílias de todo o género: o desgaste relacional, a diferença de opiniões quanto à orientação educacional dos filhos, os vícios de personalidade, as expectativas goradas, o crescimento interior que se processa contra aqueles que nos são próximos, a desilusão. E o remédio que acalma todos os males também não anda longe da realidade mais próxima: sexo, mentira, decepção, raiva, muita raiva, assunpção de culpas e responsabilidades e perdão - só possível deixando que o tempo faça aquilo que melhor faz: passe!
Impressionou-me a interpretação do Mark Ruffalo e da Mia Wasikowska - que interpretou Alice no Alice no País das Maravilhas, de Tim Burton - não vi, mas depois desta interpretação, apetece-me muito vê-lo.

As famílias já não são o que eram e... ainda bem!

segunda-feira, abril 18, 2011

Objectivo de hoje

Desistir.
Fugir de tudo e de todos.
Transformar-me numa mariposa de asas azuis e voar para bem longe daqui.
(Por mais que estenda a minha pele aos pés de certos e certas, nunca é suficiente. Fico sempre aquém.)
Isto de procurar ser mais em tudo o que se faz, extenua-me.
Por isso, desistir.
Fugir de tudo e de todos.
Transformar-me numa mariposa de asas soltas e livres, desaparecer de encontro ao promontório.
E morrer de alegria só com a ideia de encontrá-lo.

Esquisitices

Gosto da força da palavra ALCACHOFRA.
Gosto do som da palavra ALCACHOFRA.
Se tivesse de eleger a palavra portuguesa mais perfeita de todos os tempos, elegeria ALCACHOFRA.

domingo, abril 10, 2011

Viagem

Almada. Ponte 25 de Abril. Lisboa. A1.

Porto. Ponte do Freixo. Freixo. Batalha. Engano.

Batalha. Boavista. Rotunda. Portus Cale. Metro. Trindade. Loucos. Boavista.

Boavista. Freixo e Freixo. Foz. Praia da Luz. Velas. Rochas. Mar. Boavista.

Boavista. Freixo. A1. Lisboa. Ponte 25 de Abril. Almada. Ponte 25 de Abril. A5. Cascais.

O melhor de todas as viagens: o regresso.

segunda-feira, abril 04, 2011

Direito à vida, mas também ao amor

O amor não é um direito que se adquire à nascença (embora devesse sê-lo).


Aproveito o fim-de-semana para visitar os meus pais e os meus avós com tempo. Tenho a sorte, ainda por cima, de viverem - uns e outros - muito próximos, não na mesma rua, mas no mesmo bairro. Aliás, falar daquele bairro é falar de mim: o meu "eu" fez-se nas suas ruas, nas suas pracetas, no seu ringue.
Velho, muito velho, tem o antigamente inscrito nas paredes caducas. A igreja, que fica no átrio, ao contrário do edificado, é moderna, tem paredes de cimento e não parece sequer uma igreja. Não creio que deus venha comungar com os fiéis naquele lugar. Assim é que, não só serve para o culto das velhinhas que por ali se movimentam com dificuldade, mas também para os toxicodependentes fazerem as coisas que os toxicodependentes fazem: aumentar a sua dependência dos tóxicos.
A sorte é que as horas de culto e as outras não coincidem, pelo que a harmonia dá-se (na maior parte do tempo, pelo menos naquela em que a PSP não é chamada a repor a ordem e o sossego dos habitantes).
Poderia escrever uma história sobre cada um dos prédios que compõem o ramalhete do meu ex-bairro. Eles guardam no silêncio das suas paredes recaiadas relatos de tudo e mais alguma coisa - maridos que se enforcaram, filhos que esfaquearam pais, irmãos que casaram entre si, pais que molestaram filhas deficientes, homens enlouquecidos, mães que perderam filhos, como disse: tudo.  
Também há pessoas que sempre viveram envoltas num mistério indecifrável. Pessoas cujo entendimento escapava à maior parte.
No sábado, cruzei-me com uma dessas pessoas: cabelo comprido, grisalho, roupas circenses, atiradas contra a magreza de um corpo que deixou a agilidade uns anos antes à porta da juventude, brinco nas narinas, o andar ligeiro, arrastado.
O meu avô, que me acompanhava, perguntou à figura que acabei de descrever se estava melhor - ali, no meu ex-bairro, as pessoas ainda se interessam umas pelas outras, há a simpatia da pergunta e o fingimento do interesse:
- Cá ando, Sr. Carlos. Cá ando. Estou muito só.
Não parou, disse aquilo com o mesmo tom, a mesma inevitibilidade com que diria qualquer outra coisa menos chocante ou mais banal.
Não esqueci, até hoje, as palavras ouvidas.
O amor não é um direito que se adquire à nascença (embora devesse sê-lo). Há pessoas que vão morrer sem nunca terem tido a sorte de serem amadas (devidamente) por alguém - o direito à vida deveria implicar o direito ao amor.