quarta-feira, setembro 21, 2011

Ó Evaristo, tens cá disto?

Ainda não me tinha apercebido de que não há carros velhos a circular em Lisboa. Só reparei nisso a semana anterior, logo após o acidente que sofri na descida da Pimenteira. Apesar da força do embate, o meu carro ficou a circular, só que em vez de um Peugeot passei a ter um Smart.
Confesso que me senti rídicula a passear pelas estradas com o meu carro em fase terminal. Olhava para o lado e via as viaturas dos outros: robustas, lavadas e sem arranhões; quanto mais feridas abertas, a correr o risco de septicémia.
Lembro-me de ver - não pode ter sido assim há tanto tempo! - carros velhíssimos a passear pela cidade, a chiar de dor.
Onde estão eles? O que lhes aconteceu?
Seremos todos ricos? Seremos todos capazes de sustentar a alarvaria dos carros; seguros, IUC's?
Ou a sociedade contemporânea rejeita tudo o que é velho, defeituoso, enfermo?
Viveremos todos uma espécie de vida e não a própria em si mesma?
Não me imagino a ser feliz num lugar onde tudo funcione, seja novo e imaculado.
Ergui o rosto e enfrentei a multidão de viaturas límpidas, imberbes. O meu carro tinha, pelo menos, uma história para contar...

terça-feira, setembro 20, 2011

Da doença e das suas consequências

Estou doente...
Não há nada de mais inútil (e deprimente também) do que a doença. E eu detesto tudo o que seja inútil.
Há muito tempo que não ia ao médico; evito aquele ciclo vicioso de diagnóstico-terapêutica-medicação. Aliás, não tomo químicos - decisão que me acompanha há alguns anos. Julgo que depois de ter assistido à degradação física da minha avó paterna, que morreu com uma cirrose provocada por medicamentos. Antes tivesse bebido até à morte. Ter-se-ia divertido muito mais e sofreria exactamente o mesmo, uma vez que foi vomitando o fígado aos poucos. Ainda me lembro de ver a minha mãe de joelhos, com um pano apontado a pedaços de carne ensaguentada e de ver o líquido escorrente dos lábios da minha avó, que já não tinham cor.
Não tenho medo de morrer. Disse-o várias vezes. Não me assusta o vazio do nada. Assusta-me, isso sim, dizer adeus. Não à vida, mas às pessoas que são a minha vida.
Não estou a morrer, ou pelo menos, não me parece que assim seja. Mas sou incapaz de interpretar a vida como um dado adquirido, como qualquer coisa de interrupção difícil ou adiável. Morrerei quando morrer.
Enfim, fui ao consultório médico com sintomas de anemia - confirmada depois de umas quantas análises sanguíneas -, e saí de lá com ela, com um hipertiroidismo, mais comprimidos de ferro, mais hemogramas, mais ecogrfia à tiróide e consulta de endocrinologia. As idas ao médico parecem-me avalanchas - um sintoma pequenino acaba por reduntar numa massa disforme e descontrolada de doenças que nem sequer ouvíramos falar.
Uma coisa é certa, estou hoje um pouco mais rica em termos vocabulares: aprendi uma palavra nova e os seus efeitos: decréscimo de peso - devo ser a inveja de umas quantas mulheres! -, perda de cabelo, descamação da pele, arritmia cardíaca  e cansaço generalizado.