quinta-feira, setembro 19, 2013

Porque me fizeste mãe, filho

 - Mãe.
A palavra fica, até hoje, ancorada no meu dentro. A desdobrar-me a vida em plenitude e satisfação.

-Mãe, já viste que este ano eu só quero de presente coisas de que preciso mesmo?

Sim, já vi. Já vi que te estás a tornar homem muito rápido. Pelo menos, para mim, é rápido demais, mesmo que ficasses criança a vida toda nunca seria tempo suficiente.
O amor de mãe é sôfrego, desesperado, ambicioso e egoísta. O amor de mãe é tão egoísta.
Se eu pudesse, porque querer eu queria, serias só de mim.

Dezassete. De-zas-se-te. Dez mais sete. Dez com sete.

E daqui a nada, o voo, por fim. Como fim de uma vida que conhecemos tão bem os dois. Nós os dois, juntos.

- Filho, já viste que não me cabes no colo?
- Filho, já viste que a tua barba me pica quando me beijas?
- Filho, já reparaste que viras a cara para não me ver despida?
- Filho, já reparaste que fechas todas as portas atrás de ti?
- Filho, já reparaste que preferes conversar com os teus amigos do que comigo?
-Filho, já viste que eu estou menos mãe e tu menos filho?

Amo-te de um amor tão profundo que, estupidamente, choro só por escrever que te amo de um amor tão profundo.
Tenho tantas mas tantas saudades de nós. De nós antigamente. E tenho ainda mais saudades de nós no futuro.

És único.
És vivo.
És pleno.
És vida.
És graça.
És eu.
És nós.
És meu, mesmo sendo do mundo.
És meu, mesmo quando não existir eu.








segunda-feira, setembro 16, 2013

P de (P)essoa

música de fundo como que a embalar-me os pensamentos
se eu tivesse pensamentos
a vida impede-os
atrasa-os
adia-os
evita-os

E eu deixo-me ir, como no resto
porque não há nada que sobre depois disto que nos resta
não é dinheiro o que nos resta
não é emprego
não é economia
não é dignidade
nem é nada

mas o nada de nada, o nada vazio que está no lado oposto do nada de Pessoa

Às vezes nem pessoa nos resta
Ser pessoa obrigaria os pensamentos a acontecer
não haveria nada que os pudesse impedir, atrasar, adiar ou evitar

Ser pessoa é não poder ir, como no resto
Ser pessoa é estar com o Pessoa em quase tudo o que escreveu
é ser tudo mesmo sendo nada

É comover-nos
É compadecer-nos
É partilharmos
É descalçar os nossos sapatos e calçar os dos outros

Como descalço os meus sapatos e calço os dos outros?

Não sei, se soubesse os pensamentos sobravam-me e
hoje
neste instante
no momento em que digo "no momento"
tenho fome de silêncio