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quinta-feira, dezembro 09, 2010

Natal anoréctico

Estou aflitíssima com o Natal. Gostava de ser criativa o suficiente para oferecer a cada uma das pessoas o presente certo. O presente. Cada vez menos me entusiasmam as banalidades.
Ontem lá fiz a árvore (finalmente!) mas está tão nuazinha, escanzelada, sem qualquer embrulho a decorá-la que mais parece a Kate Moss nas piores fases da anoréctica doença.
Quero uma árvore gorda, anafada, roliça, tipo Kirstie Allen. Uma árvore orgulhosa dos seus pneumáticos. Quero, sobretudo, que cada presente aninhado aos seus pés valham a aflição de não saber HOJE o que oferecer a quem.
Acho que vou deprimir-me em frente a uma folha de papel com vários nomes, tipo escritor angustiado e às voltas com uma folha de papel em branco...

segunda-feira, outubro 04, 2010

C@s@

Queria ter uma casa para ser viva nela. Queria um canteiro de flores amarelo-alaranjadas para causar inveja aos vizinhos. Queria uma varanda para o infinito, onde pudesse vir sentar-me, ao cair da noite, a perscrutar o sonho dos outros.
Queria uma casa  sem paredes e sem tecto - só com janelas. Uma casa onde o cheiro do teu corpo (não o cheiro do teu perfume, porque o cheiro do teu perfume sem o teu corpo não cheira ao que cheira o cheiro do teu corpo com o teu perfume) me arrebatasse de dia e de noite, sem sobressaltos ou sonhos dos maus.
As paredes das casas - assim como os tectos - impedem-nos de sentir a liberdade e fazem-nos recear os que nelas não vivem. Nós somos seres de medos, foi por isso que inventámos as paredes, os tectos, os portões, as grades.
Eu não tenho medo. Mentira. Tenho um medo, unzinho. Tenho medo de que o cheiro do teu corpo (não o cheiro do teu perfume, porque o cheiro do teu perfume sem o teu corpo não cheira ao que cheira o cheiro do teu corpo com o teu perfume) não me arrebate de dia e de noite e que, por causa disso, os sobressaltos e os sonhos dos maus se venham instalar na casa que eu queria mas que não tenho: a tal do canteiro de flores amarelo-alaranjadas e da varanda para o infinito.
A tal só com janelas, que é a maneira mais simples de abraçar a vida defronte - ou como quem diz: de frente!

quarta-feira, setembro 22, 2010

Caricatura a carvão

Não é nos sons intermináveis que faz com as mãos, com os pés, com a boca.
Não é no rasto de desarrumação que arrasta atrás de si. À frente de si. Ao lado de si. Por baixo de si.
Não é nas horas que rouba ao espelho em silêncio.
Não é nas roupas que veste e que despe que-despe-e-que-veste-e-que-veste e torna a despir para vestir enfim.
Não é nos braços compridos, fortes que limitam a visão da criança que foi outrora.
Não é na maturidade do discurso: calmo, equilibrado, bem pronunciado.
Não é na insegurança do que o que os outros dizem, do que os outros pensam, os outros, os outros, os outros (e tão pouco ele).
Não é na gargalhada vibrante que acorda os mortos.
Não é no carinho aos molhos com que chama seus aos seus.
Não é na preguiça que lhe molda os gestos, passados e futuros.
Não é na ambição de fazer 59' aos 100m crowl e e não-sei-quantos a bruços e outros tantos a livres.
Não é no sentido de humor refinado, contagiante, genial com que desarma os que o ouvem.
Não é na capacidade infinita de amar dolorosamente, fidelissimamente, fervorosamente, eternamente um ser, uma causa, o nada.
Não é no gosto e no tempo que dedica à música.
Não é nos desenhos que rabisca cujos traços lhe definem a alma.
Nem nos "i-ó-mãe" ditos em tudo.
Nem na facilidade com que diz "obrigada" ou "desculpa".
Não é no sentido de protecção exímio ou expedito com que me defende das agressões externas, internas, reais mas também as imaginadas.
É em mim. E na parte minha que já é dele.
É nele. E na parte sua que já é minha.
14 anos. E o tempo a carregá-lo longe. Para longe. Lá longe. No lugar da independência.

quarta-feira, abril 07, 2010

Graffitar mentalidades

Assisti ontem a uma palestra sobre graffiti em contexto rodoviário. Exceptuando a discussão óbvia (comprensível e pertinente mas que para o caso pouco me interessa) à volta da questão da perigosidade dos graffiti e da sua potencial  interferência na circulação e segurança rodoviárias, o que achei interessante foi perceber a necessidade incontrolável do ser humano em trazer para o centro o que pertence, por natureza, às margens.
Pelo que percebi, graffitar paredes é ilegal - quanto a mim, a inexistência de legislação sobre uma determinada actividade não faz dela ilegal, aliás, determinar qualquer coisa  ilegal é porque essa coisa está contra a lei o que, inevitavelmente, faz depreender que ela exista; a questão é que não há qualquer legislação sobre os graffiti e assim deve continuar.
O que torna esta actividade tão atractiva quanto marginal é a proibitividade que lhe está inerente.
Não faz qualquer sentido - não para mim - amordaçar este tipo de manifestação artística - espontânea e imediata - a leis, até porque a arte acontece sempre quando existe a capacidade ou a oportunidade de ultrapassar  e subverter normas ou tendências.
As artes de rua são para ser vividas na rua. Apreciadas na rua. No contexto de urbanidade que lhe dão suporte.
Não parece fazer qualquer sentido vir uma lei estipular onde podem ser pintados graffiti ou que cores deverão ser usadas. É tão absurdo quanto existir uma lei a proibir, nos textos literários, o uso de minúsculas quando se devem utilizar maiúsculas, ou o uso de palavras que não estejam dicionarizadas, ou impedir que a poesia reflicta sobre trivialidades - a ser assim, o que faríamos com Saramago, Guimarães Rosa ou Manuel de Barros?
Eu cá ia numa de graffitar mentalidades...









Skater by Ram

sexta-feira, março 12, 2010

Epifania

E o que fazer naqueles dias em que se acorda cheio de ideias, cheio de textos em turbilhão na ponta dos dedos?
O que fazer nos dias em que acreditamos ser donos do mundo; em que a euforia da vida, de viver a vida, se transmite no olhar, na forma de andar?
Que fazer nos dias em que a felicidade não te deixa morrer impávido nas páginas no teu quotidiano? Em que os outros te aplaudem, sem usar as mãos?

sexta-feira, outubro 30, 2009

O Relógio

Não ser nada. Não sentir nada. Transformar esta loucura que as vozes dizem ser minha em estilhaços de coisa nenhuma.


Acordar leve, livre, solta, sem este peso do mundo em mim. Sem este "finge que ama" a ser sombra dos meus passos, sombra dos meus passos. Passos. Sombra.


Achar normal o que não é normal. Amar amando. Chorar chorando. Gritar gritando. Desesperar desesperando.


Abrir valas e grutas na alma.


Plantar corações nas plantas dos pés. Esperar que os corações cresçam. Ser só coração. Ser só. Ser coração. Ser ser.











Vida tão só, vida tão estranha. Meu coração tão maltratado. Nem já chorar me traz consolo. Resta-me só o triste fado.


A gente vive na mentira. Já não dá conta do que sente. Antes sozinha toda a vida. Que ter um coração que mente.

quarta-feira, outubro 07, 2009

Quero querer o que quero

Quero ir a Évora, à Fundação Eugénio de Almeida, ver a exposição de Mário Cesariny. Quero ir ao Espaço Lisboa, assistir ao lançamento do mais recente livro de Luandino Vieira, O Livro dos Guerrilheiros. Quero ir ao Porto ver a encenação do texto O Marinheiro, de Fernando Pessoa, pelo Teatro Plástico. Quero ir à Casa das Histórias, em Cascais, embrenhar-me nos desenhos-que-são-também-pinturas de Paula Rego. Quero ir ver alguns filmes, como Parlez-moi de la Pluie, no Cinema São Jorge, no âmbito do 10.º Festival de Cinema Francês. Quero chegar a casa e deitar-me na minha cama sem pensar em coisa alguma. Quero ler tudo o que houver sobre o massacre no Ruanda. Quero crescer e deixar que os outros cresçam. E quero ser generosa até à medula para ensinar aos ignorantes que saber receber é tão ou mais importante do que saber dar. Quero querer tudo isto que quero, como quero...

domingo, setembro 13, 2009

Prelúdio de uma despedida em violino

Violino. Piano. Saxofone. A ter de escolher, estes seriam os sons da minha banda sonora pessoal.
Detesto despedidas. Se posso, antecipo-me a elas e finto-as na curva. Antes da dita hora, já eu me despedi. Disse o adeus embargado na voz, filtrei a saudade que o tempo acentua e aprisionei memórias a que recorro em momentos específicos. As lágrimas que ficam após, a acariciar-me o rosto, são o apaziguamento da dor que veio antes, muito antes.
Oiço o violino e procuro entender o que diz. Com o piano já não é assim: desinteressam-me as mensagens que ele fala. Ao saxofone sou eu que tenho vontade de lhe dizer coisas, e mais vontade ainda tenho que ele as oiça e as entenda.

As despedidas, mesmo as pequenas, são indeterminadas. É impossível saber se a pessoa a quem dissemos adeus será a pessoa que reencontraremos no regresso. Seremos nós próprios os mesmos? Acredito que não.

Disto estou eu certa, quem desejamos reencontrar não é a pessoa que veio, mas tão só a que foi.

O som do violino. O som do piano. O som do saxofone.

Com sorte, ainda encontrarás um cabelo meu perdido no teu corpo. Se assim for, solta-o ao vento e deixa que todos os violinos do mundo te digam quem eu sou, deixa que todos os pianos se desinteressem por quem tu és e deixa, ó por favor, deixa que todos os saxofones te digam, como se a sua voz fosse a minha, mesmo não sendo, mas como se: bom-dia...

terça-feira, fevereiro 03, 2009

Tristonhos dias tristes

Dizem que o primeiro-ministro do meu país desviou dinheiro que não lhe era devido. Dizem que estamos a enfrentar uma crise económica e financeira de que não há memória. Dizem que as empresas estão a despedir gente que se farta. Dizem que os professores estão em guerra aberta contra o governo. Dizem que uma mulher foi levada pelo mar enquanto passeava no areal. Dizem que este é o Inverno mais rigoroso dos últimos anos. Dizem tudo isto com uma voz nublada e cinzenta. Com uma voz grave também; e com os olhos descaídos, num aviso óbvio de decepção e conformismo.
Eu digo que a roupa suja se acumula lá por casa; digo que o meu filho decidiu começar a namorar; que eu nunca mais desencalho; que o meu carro anda a fazer um barulho esquisito e de difícil interpretação; que a torradeira avariou; que a ficha eléctrica onde ligamos a televisão da cozinha também, pelo que não há televisão na cozinha; que não temos gás no aquecedor e que as minhas vizinhas lésbicas deixaram de dar umas quecas pela noite dentro, o que animava consideravelmente o prédio nestes dias de crise. Digo isto com uma voz estridente e colorida, na tentativa de não sucumbir à epidemia depressiva que se instala em nós como a humidade ao corpo. E digo mais: se nos próximos dias não tiver cuecas enxutas para vestir, olha, não visto cuecas!

terça-feira, janeiro 13, 2009

Conversa (mais do que) Improvável

Filho - Mãe, não quero que tu morras!
Mãe - após fazer uma festa no rosto do filho e como que acariciando-o, com as suas palavras - Está descansado, prometo-te que só morrerei depois de tu morreres.


"PORQUE É QUE OS HUMANOS ADIAM TUDO, ATÉ SER TARDE DE MAIS?"

(pensamento de Rambo, personagem do romance Myra)