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terça-feira, setembro 20, 2011

Da doença e das suas consequências

Estou doente...
Não há nada de mais inútil (e deprimente também) do que a doença. E eu detesto tudo o que seja inútil.
Há muito tempo que não ia ao médico; evito aquele ciclo vicioso de diagnóstico-terapêutica-medicação. Aliás, não tomo químicos - decisão que me acompanha há alguns anos. Julgo que depois de ter assistido à degradação física da minha avó paterna, que morreu com uma cirrose provocada por medicamentos. Antes tivesse bebido até à morte. Ter-se-ia divertido muito mais e sofreria exactamente o mesmo, uma vez que foi vomitando o fígado aos poucos. Ainda me lembro de ver a minha mãe de joelhos, com um pano apontado a pedaços de carne ensaguentada e de ver o líquido escorrente dos lábios da minha avó, que já não tinham cor.
Não tenho medo de morrer. Disse-o várias vezes. Não me assusta o vazio do nada. Assusta-me, isso sim, dizer adeus. Não à vida, mas às pessoas que são a minha vida.
Não estou a morrer, ou pelo menos, não me parece que assim seja. Mas sou incapaz de interpretar a vida como um dado adquirido, como qualquer coisa de interrupção difícil ou adiável. Morrerei quando morrer.
Enfim, fui ao consultório médico com sintomas de anemia - confirmada depois de umas quantas análises sanguíneas -, e saí de lá com ela, com um hipertiroidismo, mais comprimidos de ferro, mais hemogramas, mais ecogrfia à tiróide e consulta de endocrinologia. As idas ao médico parecem-me avalanchas - um sintoma pequenino acaba por reduntar numa massa disforme e descontrolada de doenças que nem sequer ouvíramos falar.
Uma coisa é certa, estou hoje um pouco mais rica em termos vocabulares: aprendi uma palavra nova e os seus efeitos: decréscimo de peso - devo ser a inveja de umas quantas mulheres! -, perda de cabelo, descamação da pele, arritmia cardíaca  e cansaço generalizado.

sábado, maio 07, 2011

A bela adormecida

Há coisas tão simples que são, exactamente ao mesmo tempo, surpreendentes e inexplicáveis.
Um dos meus alunos estrangeiros do curso de Português que lecciono no ISA deixou-me uma mensagem inacreditavelmente bela no facebook. Não sei quanto tempo aquela mensagem ficou por ler, afinal, não sou facebooker assídua ou facebooker dependente. Ainda assim, foi capaz de me acordar de um sono em que estava belamente adormecida...

segunda-feira, setembro 13, 2010

Caixinhas

Os dias de Setembro são frescos. Mesmo que o sol intensifique nos céus, já não aquece como antes.
Uma destas manhãs fui acordada por sons antigos. Daqueles sons familiares, próximos, ainda que totalmente adormecidos ou guardados em caixinhas multicolores na minha consciência.
Foi com alguma surpresa que os meus ouvidos se apropriaram da melodia e o meu cerébro a reconheceu: ouvi um amolador, mais a sua gaita, a anunciar presença na proximidade do 302.
Antigamente, os amoladores vinham em bicicletas ferrugentas oferecer os seus préstimos às donas de casa de bairros periféricos. Julguei que a profissão estivesse extinta. Tal como as donas de casa. Pelos vistos, enganei-me.
Este amolador vinha de moto. Ferrugenta. Ao bairro periférico, no 302. Mas não houve dona de casa que se aproximasse. Assim veio. Assim foi. Sem história, a não ser o facto de ter acordado em mim sons da infância, cada vez mais distante, preservada em caixinhas multicolores na minha consciência.
Também as haverá escuras. Pretas. Sombrias. Como a caixinha de Pandora, que guardava todos os males da Humanidade.Que a essas não haja melodia que as desperte. Assim reze a esperança...

quarta-feira, agosto 04, 2010

Embriagada de palavras

Outro dia disseram-me: tens escrito menos, o que significa que estás feliz.
Ainda que não se deva reduzir a escrita ou a necessidade desta a estados de espíritos, a verdade é que ela  nasce de uma certa inquietude - com o presente, passado ou futuro. Inquietude com os outros, com o mundo ou connosco próprios. 
A felicidade não produz nada de prático, é inebriante e estática, como uma droga que se injecta, fuma ou inala.
Quem nunca sentiu a dor profunda, a inquietude irrequieta, permanente, inexorável nunca viveu a plenos pulmões; logo, desconhece este pendor para as palavras. Esta mania de desenhar o mundo em sílabas.
É verdade que me sinto mais feliz do que outrora. Há uma tranquilidade intransigente instalada aqui.
Mas também é verdade que não consigo hipotecar esta mania de interrogar tudo, todos, sempre.

Quinta do Lago Silencioso

"Ondas azuis, ondas verdes, todas elas se abrem num rápido leque sobre a praia, contornando o pontão coberto por avezinho-do-mar e deixando pequenas poças de luz aqui e ali, espalhadas na areia"

As Ondas,Virginia Woolf

Estou sozinha. Passeio pela praia. Não há muito gente. Ainda há lugares que conseguem preservar a nossa identidade.
O sol acaricia-me com os seus dedos de luz. A minha pele aguenta. Caminho pelo areal imenso, mas não me sinto perdida. Vou em frente, nem mais nem menos.
Tenho medo. Não mais nem menos do que estas pessoas que não conheço e que estão aqui comigo, embora não estejam.
Tenho o livro debaixo do braço. Ter livros para ler acalma-me.
A praia acolhe o bom. Há risos que morrem nas vagas, há euforias que desaguam nas areias e existo eu mais o meu livro. 
O meu pensamento não pára. Não há silêncio que lhe resista. Mais rápido do que eu chega às rochas que me impedem de seguir mais à frente.
Por vezes, gostava de parar o meu pensamento. Não é bom pensar tanto. Há momentos em que me dói a cabeça de tanto pensar.
Está na hora de regressar. O tempo espera-me e o mar está prestes a devolver-me o meu amor.

quarta-feira, julho 28, 2010

As noites: em claro.

QUANDO o claro dos dias se prolonga pelas noites, percebo que há alguma coisa a perturbar-me, a perturbar-me de tal modo que impede que o sono aconteça.
Não fui, até agora, capaz de identificar o que não me deixa dormir.
Se fosse supersticiosa, que não sou, diria que algo está para acontecer-me.
Se fosse medrosa, que não sou, dormiria com a luz acesa.
Se fosse mariquinhas, que não sou, já teria contado isto à minha irmã, ao meu namorado, à minha mãe, ao meu filho, aos meus avós, tios e primas.
Ainda assim, se fosse pedinchona, que não sou, pediria que as minhas noites de tranquilidade absoluta regressassem...

segunda-feira, julho 19, 2010

Anticlímax

Quem nunca se sente triste não sabe como apreciar verdadeiramente a alegria...
Não suporto as segundas-feiras. Não suporto filas de trânsito causadas por acidentes que ocorreram na faixa contrária. Não suporto condutores que insistem em percorrer as auto-estradas nas faixas de rodagem centrais. Não suporto a alegria dos vãos. Não suporto a tristeza como regra. Não suporto crianças que choram por tudo mas também por nada. Não suporto o cheiro do tabaco na boca dos outros. Não suporto quando me apontam falhas. Não suporto gente sem palavra. Não suporto palavras sem nexo. E amor sem sexo.
Não suporto a cobardia. Sobretudo a minha. Não suporto as pessoas que acreditam que ter dinheiro é ter o importante. Não suporto os emails em cadeia. Muito menos os que me aconselham a sentir-me feliz só por acordar. Quem disse que a felicidade se cumpre na rotina dos dias?
Não suporto gente que não chora. Ou que não canta. Ou que não dança. Não suporto quem escreve textos em que o assunto é "não suporto isto ou aquilo" ou "gostava disto ou daquilo". Não suporto frases que começam com "eu nunca ...". Não suporto mau hálito. Nem alcóol.
Não suporto aqueles que não respondem a SMS ou não devolvem chamadas telefónicas. Não suporto atender o telefone em quaisquer circunstâncias. Não suporto conversas como:
- Olá, tudo bem.
- Sim, tudo bem. E tu?
- Eu estou muito bem, obrigada.
- Liguei só para saber de ti.
- Está tudo bem.
- Então vá.
- Vá, beijinho.
Não suporto a espera. Nem a ansiedade. Nem o ciúme. Não suporto ficar sem saber o que dizer. Não suporto não ter nada para dizer. Não suporto dizer nada só para preencher vazios.


quinta-feira, julho 15, 2010

Estado da Nação

Digo que os meus dedos se atrasam em tocar demoradamente as teclas, transformando esse toque em escrita, como alquimista burilando freneticamente;
Digo que não escrevo por preguiça, para atrasar o pensamento e não impedir a vida;
Digo que não escrevo por obrigação, porque tudo o que é obrigado cansa, é inútil e dispensável;
Digo que, apesar do silêncio da escrita, não estou morta;
Digo: sou viva. Sou vida. E por ser tudo isto, aborreço-me e sinto-me exausta só de pensar em escrever.

quinta-feira, junho 17, 2010

Off

De vez em quando odeio a minha vida. Odeio a minha pele. Odeio o que digo, o que penso, a forma como digo o que digo e penso o que penso.
De vez em quando, olho para mim e detesto-me. Detesto a rotina dos dias, o trabalho instalado na rotina dos dias, o que se diz, o que fica por dizer.
De vez em quando apetecia-me virar para mim o comando da televisão e carregar eu mesma no OFF...

quinta-feira, maio 06, 2010

Inércia

Há alturas que adormeço torpemente sobre os meus sonhos ou desejos. Fico como que anestesiada, aceitando com um sorriso o que a vida me oferece como ementa diária. Mas como eu gosto mais de mim é quando, esfaimada, devoro a ementa da vida que é minha e a outra que não é mas que eu procuro que seja. Quando até as sobras devoro, sem  me preocupar com regras de etiqueta. Nessas alturas, se não houver garfo à vista, sorvo o que houver com as mãos. Também não limpo a boca, deixo aqueles restos fossilizarem na minha boca, para que a memória a eles recorra em tempos de crise.

quarta-feira, março 10, 2010

Kidgarden

Estou certa de que a vivência do nosso mundo interior está cheia de absurdidades - umas mais abstractas do que outras - e até de algum maquiavelismo.
Há um jogo que repito com  frequência, principalmente na banheira: fecho os olhos e tomo banho com eles fechados. Dá-me alguma satisfação perceber que naquele espaço minúsculo me safo com alguma ligeireza. Sei onde encontrar o shampoo e o gel de banho. E raramente me atrapalho com o manuseamento da torneira.
Às vezes também utilizo uma única mão a vestir-me; demoro o dobro do tempo, é certo, mas consigo fazê-lo.
O bom deste tipo de jogos é ter consciência que eles não duram mais do que a minha vontade.

terça-feira, fevereiro 09, 2010

O peso da vida

O aumento de trabalho súbito e sem pré-aviso tem-me afastado das páginas do meu diário pessoal. Ao início do dia sou arrastada para um turbilhão de "coisas por fazer" ao final do dia sou mitigada pelo peso das "coisas feitas e das que ainda faltam fazer".
Acho que preciso de tempo.
Alguém tem tempo para vender? Para emprestar? Para oferecer?
Alguém?
Olá?

quarta-feira, fevereiro 03, 2010

Lágrimas de rio

Quando eu era pequenina e cabia na palma da mão dos grandes ou no abraço quentinho da minha mãe, sem que sobrasse de mim qualquer pedaço visível, atravessar a Ponte 25 de Abril era um momento de euforia e medo. Lembro-me de pedir ao meu pai que passasse com o carro na via com furinhos, na via de onde se podia espreitar o rio. Era raro abrir a janela, tinha medo de que o rio, ao sentir-se bisbilhotado, me engolisse inexoravelmente, mas encostava  o meu rosto de encontro à janela para que a visão se desse dentro dos meus olhos.
Uma vez, num Verão qualquer, por causa da ausência de ar condicionado, o meu pai manteve todas as janelas do carro abertas e, ao passarmos na Ponte, uma vespa entrou e picou-me o pescoço. Entendo agora que as lágrimas que chorei nesse dia não foram de dor. O rio percebeu que eu não o iria reter nos meus olhos, porque estava demasiado ocupada em esquecer a ousadia da vespa que me picara, e fez-me uma visita. Não tendo eu olhado o rio, veio ele olhar-me a mim, e as lágrimas que pensei chorar, eram, afinal, as mãos de água que o rio usou para me acarinhar na visita que não lhe fiz.

quarta-feira, janeiro 27, 2010

Melancolia da escrita

Há dias em que acordo com letras nos dedos, em que a boca se desbraga em palavras que não são palavras de dizer, são antes palavras de escrever. E se não tapo a boca com as mãos, as palavras saltam, aos molhos, com vontade própria. Ainda assim, de boca tapada, as palavras de escrever escorrem-me por entre os dedos, pelas fissuras de pele e carne que as mãos contra a boca deixam a descoberto. E se, por acaso, a rotina das coisas por fazer me impedem as palavras de escrever, o meu corpo revoluciona-se, embarga-se e embriaga-se de asco, de nojo, de ódio.
Não me impeçam as palavras de escrever. Não me impeçam de dizer escrevendo, porque a alternativa entre morrer e viver faz-se, em mim, na escrita, pela escrita, sendo escrita. Fora disto, sou apenas um corpo em putrefacção perene que se arrasta pelos dias como assim pelas noites.

segunda-feira, janeiro 04, 2010

Lepidópteros* na barriga

Já muito foi dito sobre a sensação "lepidópteros na barriga". Não é sobre isso que eu quero falar. Fico-me apenas com os lepidópteros e a barriga em separado.
Cresceram-me asas, nos últimos dias. Não têm escamas, nem libertam odores, mas permitem-me voar. E se me dão permissão para fazer coisas, eu faço-as; pelo que tenho voado muito. Voo encarpado nos sentimentos próprios e também alheios, que isto de ter sentimentos sozinha é uma seca. Não estou ainda muito certa, ainda assim, sinto-me segura o suficiente para dizer que estas asas têm o tamanho perfeito. A alinhação ideal. São asas com contornos de liberdade: fortes, seguras. Com umas asas destas, só me apetece descolar.
A barriga... bem... depois das festas todas, a barriga precisa de afinações rápidas. A começarem imediatamente com as aulinhas de ginástica ao final do dia. Argh! Esta coisa de ser magra tem do que se lhe diga. A verdade é que se a barriga estiver demasiado cheia, lá se vai a sensação de "lepidópteros na barriga";  se não há espaço para a comida não haverá para os lepidópteros!

*Lepidópteros: nome científico dado às borboletas. Do grego, lepis que significa escama e pteron que significa asa. As borboletas têm escamas nas asas, daí a razão do nome.

quarta-feira, dezembro 16, 2009

Aniversário 34.º

"A vida é um sopro"

Hoje é o meu aniversário 34.º. Antes, antes de tudo, estava convencida de que o dia 16 de Dezembro só existia no calendário porque eu nasci, pelo que esse dia era meu: pertencia-me. Não foi difícil convencer-me disso: entre tantos dias existentes, um haveria de ser só meu. Mas este pensamento ligeiro e absolutamente ingénuo não durou mais do que uns simples minutos - são minutos e não anos a medida de tempo correcta que dista entre o dia em que éramos donos do mundo e o dia em que o mundo é dono de nós.
Percebi, então, que o dia 16 não me pertencia de todo, como também pertencia a outras pessoas que nasceram igualmente nessa data. Em vez de me sentir triste ou revoltada ou frustrada, senti-me feliz, segura de que a vida é muito mais vida se ao nosso lado estiver gente - muita gente - que nos acompanhe neste sopro fugidio.
Não gosto de ser sozinha. Gosto, ao contrário, de estender a mão em todas as direcções e sentir que essa mão toca outras mãos em melodias descoordenadas, atrapalhadas, distantes, próximas, reais, imaginadas, doloridas, ineficazes, incapazes, verdadeiras, efusiantes, inebriantes, intensas, indeléveis, passageiras. É pela razão desse toque que ainda vale a pena celebrar o dia do meu aniversário.
Parabéns a mim. Parabéns a ti. Parabéns  a nós, que somos tantos.

segunda-feira, dezembro 14, 2009

Surfando na idade

Haverá uma idade indicada para para iniciar seja o que for na nossa vida?

Ontem tive a minha segunda aula de surf. Nada de especial se, entretanto, não fizesse tanto frio na rua. Só fui capaz de esquecê-lo (e apenas por breves instantes) no momento em que o professor chegou e nos disse - sem nos dar qualquer hipótese de escolha - "vão buscar os fatos". E eu fui. E eu despi-me na praia, em frente a várias pessoas que desfrutavam do sol brilhante, mas não quente, que iluminava a esplanada e me olhavam com olhos de comiseração: enquanto eles se encontravam envoltos em camisolas, camisolões, casacos, casacões, gorros, luvas, cachecóis, eu ia ficando em pelota, preparada para vestir o fato.
Assim que agarrei na prancha e entrei na água esqueci o frio de vez. O prazer das ondas no meu corpo, o cheiro do mar e a vontade de me pôr em pé na prancha foram suficientes para o frio deixar de ser determinante.
Descobri, só agora, que gosto de surfar - ou melhor, gosto da ideia de um dia vir a surfar - e vou fazer de tudo para agarrar este desejo meio adolescente que me nasceu no meio de uma idade já nada adolescente.

(Obrigada R. pelos ensinamentos e tranquilidade transmitida no mar em chamas)

quarta-feira, outubro 28, 2009

Rotinas: a fuga

Não sei o que se passa no mundo. Esta semana tenho-me sentido desligada de tudo. As rotinas instalam-se e, por vezes, é difícil escapar delas. Aguardo pela sexta-feira e pelas músicas de Rodrigo Leão. Aguardo pelo embalo gentil daquelas melodias claras e revigorantes, que contam histórias que me apraz ouvir. Aguardo pelo passeio matinal de sábado e pela visita aos meus avós, que aguardam, em silêncio, que eu os visite. Aguardo também pela minha primeira aula de surf, no domingo. E com estas coisinhas todas vou redesenhando uma semana que, não fossem elas, seria apenas uma semana, de tantas outras que já passaram por mim.

quinta-feira, setembro 17, 2009

simples, como eu gosto

sou simples no meu jeito desajeitado de ser. sou simples porque gosto de coisas simples: um gelado comido no verão; um pôr-do-sol vislumbrado entre amigos; de dançar a dança que me nasce dos pés; de rir devagar, depressa, sozinha, com os outros; de passear de mão dada sem me interessar pelo mundo que existe para lá dessas mãos entrelaçadas em segredos; de abraçar e ser abraçada; de um "és bonita" ou "estás bonita"; de um "gosto de ti" infantil e tosco; de cantar, ainda que mal, as músicas de que tanto gosto de ouvir; de fingir que não me importa quando tudo o que me importa é o importar que tenho com os outros e que os outros têm comigo; de cuspir no ar as pastilhas cansadas da minha boca; de entrelaçar fios de cabelos nos meus dedos, quando me sinto nervosa ou triste ou chateada; de roer-me por dentro para evitar o amor porque com ele vem também a saudade, o medo, a insegurança e a patetice.

Sou desajeitada no meu jeito simples de ser. não consigo associar a direita e a esquerda à direita e à esquerda; sou incapaz de guardar segredos se não me avisarem que o que acabaram de me contar é, efectivamente, um segredo; escrevo sms, tomo o pequeno-almoço, leio, canto no trânsito sem me importar que estou no trânsito; tenho um relógio próprio que comanda desastrosamente a minha vida: tempo total para o amor, total para a amizade, total para o trabalho, total para a diversão, total para a seriedade, o que resulta na minha total falta de tempo para o essencial: ter comida em casa, caso me dê a fome; ter roupa lavada, caso precise de me vestir. chego SEMPRE atrasada a todo o lado, combino saídas para a mesma hora e para o mesmo dia com 3 pessoas diferentes e insisto que vou, que estarei lá, quando sei que não. e durmo de boca aberta, também adormeço com facilidade, é só deitar a minha cabeça entre duas almofadas. detesto iogurtes de pedaços, leite, queijo misturado em comida, pinhões, nozes, amêndoas. admito os cogumelos, mas faço cara feia ao bacalhau, ao polvo e às caracoletas.
mas sou simples no meu jeito desengonçado de ser.