Quando eu era pequenina e cabia na palma da mão dos grandes ou no abraço quentinho da minha mãe, sem que sobrasse de mim qualquer pedaço visível, atravessar a Ponte 25 de Abril era um momento de euforia e medo. Lembro-me de pedir ao meu pai que passasse com o carro na via com furinhos, na via de onde se podia espreitar o rio. Era raro abrir a janela, tinha medo de que o rio, ao sentir-se bisbilhotado, me engolisse inexoravelmente, mas encostava o meu rosto de encontro à janela para que a visão se desse dentro dos meus olhos.
Uma vez, num Verão qualquer, por causa da ausência de ar condicionado, o meu pai manteve todas as janelas do carro abertas e, ao passarmos na Ponte, uma vespa entrou e picou-me o pescoço. Entendo agora que as lágrimas que chorei nesse dia não foram de dor. O rio percebeu que eu não o iria reter nos meus olhos, porque estava demasiado ocupada em esquecer a ousadia da vespa que me picara, e fez-me uma visita. Não tendo eu olhado o rio, veio ele olhar-me a mim, e as lágrimas que pensei chorar, eram, afinal, as mãos de água que o rio usou para me acarinhar na visita que não lhe fiz.
5 comentários:
Ora aqui está uma visão muito romântica de um api-ataque!...
Como seria este post se tivesses entrado em choque anafilático?:)))
Lembro-me tb de ser assim...com a ponte, e a faixa entreaberta para o rio:)))
Hydra do meu coração, o que é isso de choque anafilático? Vou já googlar! :D
Na tua infância - como na minha - a Ponte era mais que uma passagem, mais do que algo que se atravessa para chegar ao outro lado. A Ponte como um lugar que assusta e inspira.
;)
O nome oficial da Ponte é Ponte de Salazar
Não gosto do nome oficial!
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