Tenho a janela do gabinete semi-aberta, por causa do calor que se faz sentir. Dessa frecha de janela, vários sons são convidados a entrar, sons que me escapam na maior parte do tempo. Distingo, ainda agora, sons de pássaros e imagino que andem em rodopio, de ramo em ramo, habitanto as árvores que habitam a margem do rio Tejo. Oiço igualmente sons de carros em andamento e um ou outro de aviões, que entram e saiem dos céus de Lisboa. E se estiver muito atenta, consigo ainda ouvir o rio, as ondas subtis do rio existindo para si próprias; ou o som que as tágides fazem em busca de nova inspiração.
Ontem à noite fui visitada pelo silêncio e deixei-o entrar. Por momentos, senti o meu coração acelarar, o peso do silêncio era tanto que tive medo de não conseguir sustentá-lo. Na verdade, não consegui. Fugi para o meu quarto e refugiei-me no Jorge. Abri-o, desfolhei-o e indaguei-o sobre o silêncio. Em troca, só me falava da poesia. Só mais tarde percebi, não há forma mais eficaz de escapar ao peso do silêncio do que ter uma voz em permanência conhecedora da "existência das palavras e a possibilidade de tecê-las em poesia".
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