Há hospitais fresquinhos, acabadinhos de nascer, que não têm lugar para todos os doentes.
A desculpa técnica é a do subdimensionamento - palavra chique - mas que pouco diz aos familiares que se deslocam às instalações e encontram o seu doente numa maca, à porta de um quarto com lotação esgotada.
Eu pago impostos. Os meus pais pagam impostos. Os meus familiares pagam impostos.
Eu pago a Segurança Social. Os meus pais pagam a Segurança Social. Os meus familiares pagam a Segurança Social.
Alguém me explica por que está, então, o meu avô, de 90 anos, num corredor de um hospital fresquinho, acabadinho de estrear?
Alguém me explica por que está o meu avô, com a sua doença, a sua dignidade ferida, a sua fragilidade natural, à mercê do olhar dos que passam?
O meu avô está neste corredor, sem forças, a fazer xixi ensaguentado para um plástico transparente, que qualquer um pode ver.
Eu sei que o meu avô tem 90 anos. E que a sua vida já aconteceu. Mas enquanto os olhos dele não se fecharem de vez, não há quem lhe cale a desconfiança e a incerteza daquele lugar. Nem a ele nem a mim.
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