segunda-feira, setembro 08, 2008

Viagens na minha mente

Adormeci devagar; não tinha pressa: consegui transformar os segundos em minutos, os minutos em horas e as horas em eternidade. Adormeci apenas quando o sono se tornou impossível de adiar. Na minha cabeça, como num sonho, havia conversas desmedidas, conversas que começavam com um: " Sou loira, de olhos castanho-esverdeados (...)" e terminavam com: "E sou frágil, quebro com o vento ou de encontro ao vento." Assim que a palavra FRÁGIL ecoou pelo espaço, houve silêncios retraídos e o pressuposto de que a fragilidade é assustadora. Mas não é. A fragilidade é a força dos convictos, dos que acreditam que ao estenderem a mão, as mãos, vão sentir mais facilmente a brisa da vida. Na minha cabeça, as vozes escutavam-se mutuamente, mais do que isso, as vozes procuravam aprender uma com a outra: "São Tomé, Chile e Ásia" "Talvez Brasil, África, Antárctida"; "Bife com arroz de ervilhas, nunca queijo, nem frutos secos (talvez apenas amendoins)"; "Peixe, definitivamente, nunca iscas nem ovos escalfados com ervilhas". E como dentro de um barco que ondula ao sabor das ondas e do vento, e também ao sabor dos peixes que o habitam - há imensos peixes no mar, há uns que se chamam sargos, outros fanecas, outros cavalas e todos eles se pescam com uma cana e um anzol que se oculta com carne de camarão - aquelas vozes empreendiam viagens que não pediam regressos. Quando os olhos de alguém estão tão perto que nos podemos ver ao espelho, quando um hálito quente nos conforta os domingos tristes, não se pensa em regressos só em partidas, regressar cansa tanto e partir traz-nos sempre a vontade do que está por vir.
Viagem
Aparelhei o barco da ilusão
E reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho,
e traiçoeiro
O mar...
(Só nos é concedida
Esta vida
Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos).
Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma dia-a-dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura...
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.
Miguel Torga
P.S. Obrigada, Diogo, pelo poema...

Nenhum comentário: